Inédita no mundo, técnica foi testada em pacientes do Hospital Risoleta Neves
No mundo, uma pessoa é amputada a cada 30 segundos devido ao diabetes e às complicações dessa doença. Isso ocorre devido à associação com a “Doenca Arterial Periférica”, grave, com comprometimento do fluxo sanguíneo para membro inferior devido aos danos ao sistema arterial, causados principalmente pelo diabetes e tabagismo. O tratamento padrão consiste na cirurgia de revascularização por meio de pontes de safena ou de angioplastias e stents. Entretanto, para alguns pacientes a amputação do membro inferior é a única alternativa para salvar suas vidas.
Uma técnica inovadora desenvolvida em Belo Horizonte traz esperança para alguns desses casos. Ela consiste no isolamento de um concentrado de células-tronco isoladas a partir do tecido adiposo do próprio enfermo, que em seguida é administrado no membro comprometido. Essas células regenerativas têm como característica a capacidade de induzir a formação de novos vasos, proporcionando maior aporte de sangue ao membro, com o potencial de evitar a amputação. Por fazer uso das células do próprio paciente, não há riscos de rejeição ou conflitos éticos nessa modalidade de tratamento.
Evitar a amputação é o resultado almejado pelos médicos Prof. Dr. Túlio Navarro, Lara Lellis Minchillo e Prof. Dr. Alan Dardik, além da bióloga Profª. Dra. Lucíola Barcelos. Elaborado por meio de uma parceria entre a Faculdade de Medicina da UFMG, a Universidade de Yale e o Instituto de Ciências Biológicas da UFMG, esse estudo conta com a participação das equipes de Cirurgia Vascular e Cirurgia Plástica do Hospital Risoleta Tolentino Neves (HRTN) e do Hospital das Clínicas (HC), além da Enfermagem, Fisioterapia, Nutrição e Clínica Médica do HRTN e Biologia do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais (ICB-UFMG).
Um dos destaques do projeto é o método inovador de isolamento de células-tronco. Para desenvolvê-lo, os pesquisadores utilizaram os aprendizados adquiridos em um intercâmbio na Universidade de Yale com os métodos já em uso no ICB-UFMG pela Profa. Lucíola. “Nos Estados Unidos, aprendi a técnica de extração enzimática de células-tronco obtidas a partir do tecido adiposo. Mas lá este método ainda não havia sido testado em seres humanos e implica um custo maior por fazer uso de enzimas durante o processo de isolamento”, afirma a pesquisadora Lara. O método foi então adequado à necessidade brasileira, com um custo bem menor. “Foi necessário criar uma técnica própria, de isolamento mecânico, possível de ser realizada aqui no Brasil com a nossa estrutura”, revela a pesquisadora. Devido ao baixo custo, a técnica inovadora – caso se prove eficaz – poderá ser oferecida aos pacientes do SUS de modo regular num futuro próximo.
Resultados positivos
Aprovado pelo Comitê Nacional de Ética em Pesquisa e pelo Comitê de Ética da UFMG, o primeiro tratamento com esse novo método
foi realizado, em junho deste ano, utilizando a estrutura do HRTN e do HC da UFMG.
De acordo com o Prof. Túlio, a paciente já havia passado por quatro cirurgias de revascularização, restando a amputação como única opção no momento devido ao início de gangrena e dor. “Resolvemos testar o método como uma saída para essa paciente, que não dormia há semanas devido à dor muito intensa. Ela e a família aceitaram e, no dia 18 de junho, fizemos o procedimento. Consideramos o processo exitoso porque, desde então, houve controle da dor e parada de progressão da gangrena, demonstrando que a técnica até o momento foi bem sucedida. Após um mês da aplicacao, estamos verificando que seu corpo está respondendo bem, formando novos vasos”, afirma.
“Essa técnica poderá representar uma ruptura de paradigma com aplicabilidade em muitos outros casos do SUS”, conclui. O objetivo é oferecer um procedimento mais eficiente e barato do que os caros e muitas vezes paliativos métodos de revascularização utilizados normalmente.
O mesmo método será realizado em outros pacientes do Hospital Risoleta Neves, uma vez que a doença é muito prevalente e no Brasil existe uma taxa de amputação muito alta, devido ao fato de os pacientes chegarem ao hospital em estágios muito avançados. “Até neste aspecto o HRTN tem inovado: apresenta taxas de amputação semelhantes aos melhores hospitais europeus, pois utiliza equipe multidisciplinar com profissionais qualificados e dedicados ao problema em Enfermagem, Fisioterapia, Terapia Ocupacional, Cirurgia Plástica, Ortopedia, Infectologia, Clínica Médica e Nutrição”, conclui Prof. Túlio.
O projeto
Chamado “Limb Rescue” (“Resgate do Membro” em português), o projeto faz parte do Programa de Pós-Graduação em Cirurgia e Oftalmologia da Faculdade de Medicina da UFMG.